Resumo
Considerando a importância de rasurar estruturas de opressão estabelecidas no empreendimento colonial, o presente trabalho apresenta, sob o viés decolonial, um estudo sobre as práticas de Tradutores/Intérpretes Negros baianos de línguas sinalizadas ao utilizar signos de negritude, em um movimento estético/cultural e político. Essa dinâmica tensiona o uso comum da vestimenta de cor preta, cuja função é a neutralização da identidade racial do/a profissional. Com efeito, o uso de signos que representam valores estéticos e culturais de negritude assume papel de valorização da identidade negra, tradicionalmente, estigmatizada, mediante a constituição do racismo como elemento estruturante de sociedades, sobretudo, as pós-colonizadas. A partir de imagens de tradutoras e tradutores Negros baianos, nos vídeos intitulados “Live Leve - Ivete Sangalo” e “Leve axé - Francisco Gil - Versão em Libras”, problematizamos a irreflexão atribuída a muitos profissionais tradutores/intérpretes negros quanto a valores simbólicos e socioculturais de influência racial eurocentrada, imbricados ao longo dos anos de forma inconsciente no imaginário de profissionais negros, em consequências de processos de escravização e colonização no Brasil. A máxima “uma conduta adequada de se vestir, sem adereços”, no intuito de manter “a dignidade da profissão” (BRASIL, 2004) e o uso da vestimenta de cor preta memoram mais a tentativa de neutralização de identidades raciais, a partir de um padrão universal hierárquico racial de branquitude, incidindo no controle de corpos negros e a aniquilação da manifestação de artefatos da cultura negra, a fim de atender a uma agenda normativa, do que a necessidade de estabelecer um pano de fundo capaz de garantir o contraste para as mãos durante a sinalização. Portanto, nos amparamos na teoria do letramento racial crítico para avaliação das escolhas de vestimentas realizadas pelos tradutores/intérpretes, nos vídeos mencionados, que levaram em conta os tons de suas peles negras e sua ancestralidade - no uso de adereços representativos de suas identidades. A relevância social desses dados revela para as comunidades de tradutores/intérpretes, por meio desse gesto estético-político, para além da compreensão do enunciado, o enriquecimento do serviço ao suscitar valores históricos, geográficos, culturais, sociais, identitários e raciais.