Resumo
O trabalho do intérprete é de extrema relevância considerando que torna possível a compreensão mútua em uma situação de sala de aula de pós-graduação. Em salas de aula com uma maioria de alunos ouvintes costuma haver uma baixa participação dos alunos surdos no discurso de sala de aula. Nesse estudo é analisada a participação concreta dos alunos surdos nas disciplinas de mestrado, na área da linguística da UFSC, mediada por intérpretes de língua de sinais. Os objetivos do trabalho são: documentar de forma quantitativa e qualitativa as interações dos alunos surdos na sala de aula e as estratégias aplicadas pelos intérpretes para permitir a participação ativa dos alunos das discussões em sala de aula. Leite (2008) traz importantes considerações acerca da troca de turnos no decorrer da conversação. Roy (2000) analisou a interação entre um aluno surdo e sua professora em uma situação fora da sala de aula constatando que o papel do intérprete é fundamental para que os alunos surdos tenham participação adequada na interação através da negociação de tomada de turnos facilitada pelos intérpretes. Van Herreweghe (2002) compara a interação entre surdos e ouvintes com e sem intérpretes em diferentes situações, sugerindo que com intérpretes os surdos permanecem mais passivos em relação à negociação da troca de turnos. Os dados para a presente pesquisa foram obtidos por filmagens realizadas com duas câmeras, uma focada nos intérpretes e a outra com foco nos alunos surdos do grupo. Os vídeos de cada câmera foram editados e alinhados para permitir uma sinopse sincronizada do discurso de sala de aula em LS e PB. O EUDICO Language Annotator – ELAN foi utilizado para a classificação dos tipos de interação. Foi verificada a existência de três tipos principais de interação: a comunicativa (interação dos alunos surdos com o professor e os colegas ouvintes sobre o tema da aula), a meta-comunicativa (interação dos alunos surdos com os intérpretes, p. ex., para esclarecer dúvidas a respeito de sinais usados) e a comunicação paralela (sobre assuntos não relacionados à aula). A aula utilizada como base para as reflexões dessa comunicação possui caráter dialógico, onde os alunos ouvintes do grupo interagem com muitos questionamentos vivos. Apesar disso, muitas das interações dos alunos surdos foram do tipo meta-comunicativo e muitas interações sobre o tema em discussão eram direcionadas aos intérpretes. Assim, a maioria não ultrapassava a barreira linguística entre os falantes de LS e PB. Os alunos surdos e os intérpretes formam um grupo à parte na sala de aula, permanecendo a maior parte do tempo na zona de conforto da LS. Os resultados do presente trabalho podem servir para discutir estratégias e metas de como os alunos surdos e os intérpretes podem alcançar uma participação maior dos alunos surdos no discurso de aula, e, assim, proporcionar aos intérpretes uma segurança maior no momento de tomar decisões a respeito de uma intervenção, por exemplo, para reivindicar o turno para um aluno surdo.